Emilia Pérez | Por Que os Mexicanos Reagem Contra o Indicado ao Oscar?

Quem gosta de Cinema certamente tem alguma opinião sobre Emilia Pérez, o musical em espanhol com um toque de thriller e comédia do diretor francês Jacques Audiard. Desde que estreou, a história de um narcotraficante mexicano que some e volta como mulher trans em busca de redenção tem dado o que falar, com muitos fãs e uma boa dose de haters. De um lado, o filme soma prêmios e indicações — levou quatro Globos de Ouro e está concorrendo a 13 estatuetas no Oscar. Do outro, já acumula várias críticas.

Muita gente, incluindo críticos e associações ligadas à comunidade LGBTQIA+, tem criticado Emilia Pérez por usar a identidade transgênero da protagonista como uma espécie de "fuga" do passado violento dela no cartel de drogas. No filme, a personagem finge sua própria morte e, ao fazer a transição, parece mudar completamente, ajudando até as vítimas da violência dos cartéis.

O site Pink News afirmou que o filme "perde todas as nuances quando o assunto é identidade trans", uma opinião que muitos críticos também compartilham. A GLAAD, em um artigo de opinião, chamou o filme de "retrato retrógrado de uma mulher trans", dizendo que ele é um verdadeiro "retrocesso na representação trans".

Muita gente também tem criticado a música “La vaginoplastia”, que viralizou por reduzir as cirurgias de afirmação de gênero a uma lista simplificada e meio insensível: mamoplastia, vaginoplastia, rinoplastia, laringoplastia e até a redução do pomo de Adão. No filme, o médico canta “pênis para vagina” e “homem para mulher” enquanto faz uma explicação que beira o ridículo sobre o procedimento.


Atriz principal envolvida em polêmica

Na quarta-feira, a protagonista Karla Sofía Gascón entrou em uma polêmica após fazer uma declaração em que sugeria que a equipe de Fernanda Torres e o elenco de 'Ainda Estou Aqui' a atacaram. A declaração ganhou repercussão na mídia americana e, depois de toda a confusão, Gascón tentou se explicar, dizendo que não estava acusando diretamente as pessoas envolvidas com as brasileiras, mas sim o clima tóxico nas redes sociais. Mesmo assim, a polêmica foi grande o suficiente para que alguns sugerissem que ela estaria violando regras do Oscar.

Nesta quinta-feira (30), o nome de Gascón voltou a ganhar destaque depois que a internet resgatou uma série de posts antigos da atriz no X (antigo Twitter). Os tweets geraram polêmica por tratar de temas como muçulmanos, George Floyd e até mesmo a diversidade no Oscar.

Os posts chamaram atenção em publicações como Variety e Deadline, mas a equipe da atriz e de Emilia Pérez ainda não se manifestou. Depois de viralizarem, os tweets foram deletados das redes sociais.


Nenhuma das protagonistas é mexicana

Dos seis principais personagens, apenas Adriana Paz é mexicana. Das três mais destacadas, Karla Sofía Gascón é espanhola, enquanto Zoe Saldaña e Selena Gomez são americanas.

O diretor Jacques Audiard tentou se explicar sobre a escolha do elenco: “Vi muitas atrizes no México, conheci atrizes trans, mas simplesmente não estava funcionando”, disse ele durante uma sessão de perguntas e respostas com o The Hollywood Reporter. “E então, não lembro exatamente como aconteceu, mas, em um curto espaço de tempo, conheci Karla Sofía Gascón... E depois conheci Zoe [Saldaña] no Zoom, e algo ficou muito claro para mim.


Selena Gomez e seu espanhol "indefensável"

A atuação de Selena Gomez em Emilia Pérez tem sido alvo de críticas, especialmente por sua dificuldade com o espanhol. O fato de ela não falar o idioma e, consequentemente, não conseguir se sair bem em seu papel, tem gerado bastante repercussão desde o lançamento do filme.

O ator mexicano Eugenio Derbez foi um dos primeiros a criticar duramente a performance de Gomez, chamando-a de “indefensável”. Ele e a apresentadora de podcast Gaby Meza concordaram que a falta de conhecimento do espanhol foi um dos principais fatores para o desempenho considerado fraco da atriz.

“Selena é indefensável”, disse Derbez em conversa com Meza no mês passado. “Estava assistindo com outras pessoas, e toda vez que ela aparecia na tela, olhávamos uns para os outros e ficávamos tipo: 'O que é isso?'"


Retrato negativo do México

Esses pontos iniciais fazem parte de um problema mais profundo: a forma caricata como o México é retratado por um diretor estrangeiro — que, por sinal, não fala espanhol. Em um momento em que o presidente dos EUA, Donald Trump, está perseguindo estrangeiros, muitos dos quais mexicanos, o retrato do país no filme não poderia ser mais prejudicial: um lugar cheio de corrupção e violência.

Em uma entrevista ao Hollywood Reporter, Jacques Audiard contou que visitou o México "três ou quatro vezes", mas sentiu que filmar no país seria limitante. "Fizemos a busca de locações, fizemos algumas seleções de elenco. E só na terceira visita percebi que, se trabalhasse nas locações reais, ficaria preso ao chão", explicou. "Eu tinha todas essas imagens na cabeça, mas elas não caberiam nas ruas do México."

"Quando os mexicanos dizem que o filme está retratando um México cheio de estereótipos, ignorância e falta de respeito, e ainda lucrando com uma das maiores crises humanitárias do mundo", escreveu o ator mexicano Mauricio Morales em uma declaração no X. "Talvez... apenas talvez, acreditem nos mexicanos."


Músicas questionáveis

Apesar de todo o barulho em torno de críticas sobre xenofobia e transfobia, um ponto que também incomodou bastante os fãs de musicais foi a qualidade das músicas de Emilia Pérez. Para muitos, elas simplesmente não são boas.

A jornalista brasileira Marina Person foi uma das que levantaram essa questão. Logo no começo de um vídeo publicado em seu Instagram, ela destacou: "O filme está sendo acusado de xenofóbico, transfóbico... Mas, além disso, tem algo que é fundamental: ele é um musical com músicas ruins. É insuportável de assistir. Eu adoro musical, mas as músicas desse filme... parece que a letra não combina com a harmonia e melodia."


Uso de Inteligência Artificial

Outro ponto que ganhou atenção foi o uso de inteligência artificial no filme. Cyril Holtz, responsável pela mixagem e design de som de Emilia Pérez, revelou que a produção usou IA para o processo de clonagem de voz, especialmente para aumentar o alcance vocal de Karla Sofía Gascón. Embora isso não seja uma novidade, o assunto voltou a ganhar destaque com as indicações ao Oscar, gerando discussões sobre como isso pode impactar as chances do filme na disputa pelas estatuetas.

Em meio a tantas polêmicas, Emilia Pérez segue sendo uma obra que divide opiniões, levantando questões importantes sobre representatividade, ética e a responsabilidade do cinema em retratar culturas e identidades. Mesmo com as críticas, não se pode negar seu poder de provocar debate.



Por: Ana Luisa Vieira
@naluisavieira


As notícias mais fresquinhas do cinema, é aqui! 😉


Nenhum comentário